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Saúde mental no século XXI: Progresso ou Retrocesso?

  • bixcoitodiario
  • 10 de abr. de 2019
  • 3 min de leitura

Atualizado: 24 de abr. de 2019


Depois de anos, a possível volta do eletrochoque gera discussões entre profissionais da área, pacientes e familiares.


Por Rayssa Cavalcanti


Depois de 18 anos da Reforma Psiquiátrica Brasileira - que luta por um tratamento humanizado para pacientes psiquiátricos e de saúde mental - , a eletroconvulsoterapia (ECT), volta a ser assunto de discussões e críticas. A ECT, também conhecida como tratamento de eletrochoque, é um tratamento realizado em pacientes de saúde mental, quando não se tem mais resposta com o tratamento medicamentoso. O tratamento com eletrochoque ficou conhecido ao longo dos anos por ser um tratamento desumano, já que na época em que surgiu era realizado sem sedativo e sem anestesia. Hoje, o tratamento é realizado com anestesia e/ou com sedativo e, tem mostrado pontos positivos, como é o caso da paciente Gabriela.


Segundo Gabriela*, 20, o método realizado se diferencia do usado nos antigos manicômios e, por isso é favorável. Ela conta que foi anestesiada para realizar o procedimento e que após a sessão de ECT, já conseguiu ir para casa. Gabriela, hoje após 10 sessões de ECT, vive uma vida normal. Está reaprendendo a tocar violão, é ativa e participativa no dia-a-dia e gosta de jogar jogos.

A ECT surgiu em 1937, quando dois neuropsiquiatras italianos, Cerletti e Bini, utilizaram pela primeira vez a eletricidade para desencadear uma crise convulsiva. A partir de então, a eletroconvulsoterapia ou eletrochoque como é mais conhecida, foi amplamente utilizada entre os pacientes com transtornos mentais. Ainda assim, nas décadas de 60 e 70, sua popularidade diminuiu bastante. Segundo Sabbatini, no seu livro “ A história da terapia por choque em psiquiatria. Cérebro e Mente”, a causa para a queda de popularidade do ECT poderia ser por duas razões: o surgimento e a utilização de neurolépticos mais efetivos e a crescente movimentação contraditória ao ECT em função do uso indevido e punitivo da técnica. Como foi o caso de dona Júlia* de 84 anos. Segundo Tânia*, sobrinha de Julia, o tratamento realizado foi traumático, tanto para a paciente quanto para os familiares. Tânia conta que sua tia não gosta de sair de casa, preferindo ficar sozinha, devido ao tempo em que ficou internada, tendo como companhia somente outros pacientes, funcionários e visitas de seus familiares.

Crédito: Getty images

Paciente sendo preparado para tratamento com eletroconvulsoterapia


Na época em que dona Júlia realizou o seu tratamento, ainda não era utilizado nenhum tipo de anestesia ou sedação. Sendo assim, muito mais traumático do que nos dias atuais. A eletroconvulsoterapia se realizada de forma errada pode acarretar fraturas, perdas de memória, vômitos, morte por aspiração de secreções durante o procedimento, trauma psicológico, entre outras coisas. Por esse motivo, de acordo com Associação Brasileira de Psiquiatria, em suas diretrizes sobre eletroconvulsoterapia, a indicação para o uso do tratamento é dada apenas após o paciente não responder a nenhum tratamento terapêutico ou medicamentoso.

Sendo indicado o tratamento por ECT, o paciente vai para um centro cirúrgico onde o médico anestesista vai anestesia-lo ou seda-lo e induzirá uma convulsão através de um choque, por um aparelho que permite o controle preciso da carga fornecida. O uso de relaxantes musculares e o acompanhamento das funções vitais durante o procedimento, monitorada por meio da eletroencefalografia, faz com que o procedimento se torne seguro.

A nota técnica, publicada pela Coordenação-Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas, ligada ao Ministério da Saúde, no dia 04 de fevereiro, traz em suas páginas o aval para a compra de aparelhos de ECT pelo SUS. O tratamento passaria a ser realizado também na rede pública de saúde e não somente pela rede particular.

Para a psicóloga Rossineia Mota, a nota técnica é um retrocesso em relação a

Reforma Psiquiátrica Brasileira. “O paciente precisa ser assistido por uma política

pública de cuidado ao doente, nunca como louco.” Rossineia ainda diz que “a nota

técnica tem uma proposta que atua de forma excludente e a reforma é uma

estratégia participativa. Portanto, uma não pode estar presente enquanto a outra

estiver.” Para ela “o ato de medicar precisa ser humanizado, e não uma conduta

generalizada que atravesse as diferenças apagando toda forma existente de

individualidade e subjetividade. O trabalho dos profissionais da área é prejudicado,

porque no retrocesso vem a internação, que quebra o contato com a sociedade,

potencializa a diferença de um diagnóstico por vezes resultante de uma convivência

adoecida e selvagem, quebra o vínculo com a equipe de cuidado continuado."

*nome fictício - entrevistada não quis ter seu nome divulgado

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