top of page

Baía de Guanabara resiste

  • bixcoitodiario
  • 12 de jun. de 2019
  • 4 min de leitura

Por: Jéssica Soares e Pedro Miller


No tempo que leva para ler essa matéria, mais de 4,3 milhões de litros de esgoto doméstico são despejados na Baía de Guanabara. Desses, segundo dados oficiais, apenas 35% são tratados. A Guanabara atual seria irreconhecível aos olhos dos portugueses que lá aportaram no começo do século XVI e começaram o processo que poluiu suas águas, devastou sua biodiversidade e, até mesmo, redesenhou sua geografia.




Promessas de uma baía limpa ainda são repetidas de tempos em tempos. A mais recente veio ainda no mês de maio, do secretário de Fazenda do Estado, Luiz Cláudio Carvalho, que se comprometeu a investir R$ 106 milhões em obras de saneamento na Baía, como divulgou o Instituto Estadual do Ambiente (Inea).


Os projetos de limpeza da Baía começaram ainda nos anos 1990, com Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), descontinuado em 2006 com metas não cumpridas, mesmo após gastos de quase 3 bilhões de reais. Desde 2011, está em vigor o Programa de Saneamento Ambiental dos Municípios do Entorno da Baía de Guanabara. O PSAM teve seu ápice na preparação dos Jogos Olímpicos de 2016, com o comprometimento do estado do Rio de Janeiro e do Comitê Olímpico nacional de despoluir 80% do espelho d’água. O prazo acabou sendo adiado para 2030.


Após a euforia dos jogos, os repasses para as obras necessárias foram bem menos significativos, 10 milhões em 2017 e 23 milhões em 2018, segundo levantamentos do Ministério Público. Para Emanuel Alencar, jornalista e mestre em engenharia ambiental, falta ainda muito investimento. “Nos últimos 4 anos, de 2015 a 2018, apenas 1,2% dos recursos do Fundo Estadual de Conservação Ambiental foi aplicado efetivamente em ações de saneamento. O Rio de Janeiro vem passando por um momento muito difícil, mas me parece que nunca é uma prioridade dos governos investir em saneamento básico.”



Além do descaso sistêmico dos governos estaduais, a Baía de Guanabara sofreu desastres ecológicos devastadores na história recente. O maior deles foi o rompimento dos tanques do navio iraquiano Tarik Ibd Ziyad, em 1975, o que acarretou no vazamento de quase 6 milhões litros de óleo bruto. Em 2000, a ruptura de um duto da Petrobrás derramou mais de 1 milhão de litros, contaminando diversos ecossistemas, das praias aos mangues. Após o acidente, o projeto Mangue Vivo, liderado pelo Instituto OndAzul, iniciou o processo de recuperação da fauna e flora do manguezal.


Contra todos os indicadores dos órgãos ambientais oficiais, o projeto deu certo. Contando com o auxílio dos próprios pescadores afetados pelo desastre, capacitados para atuar no trabalho de reflorestamento, além do apoio das prefeituras de Magé e Guapimirim e de instituições de pesquisa como a Unirio, UFRJ e Jardim Botânico; o Instituto OndAzul conseguiu revitalizar a região, que hoje é o Parque Natural Municipal Barão de Mauá. Para o coordenador de projetos do Instituto, Ricardo Farias, nada disso seria possível sem um esforço coletivo da população. “Na execução do projeto houve um trabalho intenso de envolvimento da comunidade local. Foram realizados cursos de educação ambiental para os jovens da região do entorno do parque, articulação com as escolas para levarem os alunos para conhecerem o mangue, atividades de mutirões de reflorestamento e de limpeza, entre outras. Foram 20 anos de muito trabalho e desafios, mas que hoje é um dos grande orgulhos do OndAzul.”


Escolas participam do projeto Mangue Vivo | Foto: Instituto OndAzul


Apesar de tantas agressões à Baía de Guanabara, a biodiversidade resiste na região. O grande destaque são os manguezais, a Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim possui a maior floresta contínua de mangue do Rio de Janeiro, com aproximadamente 5,5 mil hectares. A concentração de fauna e flora está situada na APA, criada em 1984, com o intuito de conservar o ecossistema natural, protegendo as matas e as espécies do local.


As unidades de conservação são as únicas áreas que ainda se aproximam do que a Baía de Guanabara era antes da colonização europeia. Um dos motivos é a boa localização, explica a coordenadora do núcleo de educomunicação da APA, Juliana Fukuda. “Estamos no fundo da Baía e a poluição se concentra mais do meio para fora. Aqui também não tem tantas indústrias e nem tanto esgoto caindo diretamente na Baía e, em consequência das águas mais limpas, existe uma biodiversidade maior”.



Visita guiada à APA | Foto: APA Guapimirin

Segundo o site da APA de Guapimirim, cerca de 2 mil famílias vivem diretamente da pesca na Baía, sendo que grande parte dos peixes e crustáceos se reproduzem na área de proteção. Várias atividades humanas são permitidas dentro de uma área de proteção ambiental, incluindo a moradia, desde que as casas não fiquem muito próximas dos rios e tenham sistema de tratamento de esgoto. A pesca também é legal, mas redes só podem ser lançadas na parte marinha, por conta da largura dos rios. Apesar disso, o crescimento da indústria de petróleo e gás restringiu a superfície propícia à pesca para apenas 12%. A quantidade de peixes tem diminuído também por causa de grandes embarcações, que perturbam o meio ambiente, além do derramamento de esgoto e lixo.


A poluição não está só na água e no solo, está também no ar e isso prejudica animais que têm a Baía de Guanabara como único habitat. Esse é o caso do boto-cinza, que mede até dois metros de comprimento, vive cerca de 30 anos e gera apenas um filhote a cada três anos. Esses animais, atualmente, ocupam apenas o território da APA e estão entre as espécies marinhas mais contaminadas do mundo. “A gente esquece da poluição sonora, mas o barulho dos barcos que funcionam 24 horas na ponte Rio-Niterói é muito ruim para os animais”, diz Juliana.


Tanto a APA de Guapimirim, quanto o Parque Natural Municipal Barão de Mauá são reflexos do que a Baía de Guanabara era, mas deveriam ser guias para o que ela poderia se tornar. As promessas continuam.



Commenti


© 2019 por Bixcoito Diário. Todos os direitos reservados. 

Quem somos

Site criado pelos alunos de jornalismo da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro para a disciplina de Laboratório de Jornalismo de Plataformas Digitais.

bottom of page