Mães de LGBTs+ se preocupam com momento político atual
- bixcoitodiario
- 8 de mai. de 2019
- 5 min de leitura

Por Alessandra Ananda
O Brasil é um país que possui altos índices de agressão contra LGBTs+ (lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais, entre outros). Segundo pesquisa realizada pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), a cada 20 horas, um(a) LGBT+ morre no Brasil por serem LGBTs+; ou seja, por crime de ódio. A organização também registrou um aumento de 30% nas mortes de LGBTs+ de 2016, ano no qual foram registradas 343 pessoas mortas, para 2017, que contabilizou 445 mortes. Em 2018, apesar de ter ocorrido uma diminuição, o número permaneceu alto, com a morte de 420 LGBTs+. O infográfico abaixo, retirado de reportagem d’O Globo feito com base nos dados do GGB, ilustra esses e outros números:

Com relação apenas à população transsexual do país, os números se tornam ainda mais agravantes. O Brasil, segundo dados da ONG Transgender Europe (TGEU), permaneceu, em 2017, como primeiro do ranking de países que mais mata transsexuais, contabilizando 369 homicídios no ano.
O Rio de Janeiro, um dos territórios com maior visibilidade do país, também apresenta dados preocupantes. De acordo com estudo do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP), pelo menos uma pessoa é vítima de discriminação por ser gay, lésbica, bissexual ou trans no Estado do Rio.
Em paralelo, foram eleitos, em 2018, representantes políticos que reforçam o preconceito contra esse grupo minoritário, como o presidente Jair Bolsonaro e o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella. Em 2019, no seu primeiro dia de mandato, Bolsonaro assinou decreto com mudanças nas diretrizes destinadas à promoção dos direitos humanos. A pasta responsável pelo tema não incluiu os LGBTs+, grupo que estava inserido nas estruturas do governo anterior. Além disso, o presidente já afirmou em entrevista que era “homofóbico, com muito orgulho” e se auto nomeou como defensor da família tradicional brasileira.
Em vídeo feito em 2012, Crivella se referiu à homossexualidade como um “mal terrível”. E, apesar de afirmar em entrevistas sua mudança de pensamentos, em 2018, o prefeito tentou impedir a exposição Queermuseu, baseada nas teorias de identidade de gênero, no Rio de Janeiro.
Os dois quadros somados se tornam, então, uma grande preocupação para as famílias que possuem LGBTs+ em sua formação. Para Helena Antas, mãe de Henrique Dias, de 22 anos, gay assumido para seus pais desde 2017, o momento atual gera, sobretudo, preocupação, “como mãe, fico preocupada com tanto preconceito. Eu apoio meu filho para o que der e vier, a cada dia o amo mais respeito mais sua opção, assim como apoio todos os amigos(as) dele. Espero que no futuro próximo as coisas mudem”.

Ainda segundo Helena, ela sempre desconfiou da sexualidade do seu filho, o que nunca mudou o seu sentimento com relação a ele. “Eu já desconfiava, mas não queria acreditar. Hoje sou muito bem resolvida com relação a isso. Minha relação com meu filho é de respeito amor e cumplicidade. Família é isso: respeito ao próximo, compreensão, diálogo e, acima de tudo, muito amor”, disse.
Katia Mitke, mãe de Luíza Mitke, assumida desde os 14 anos, revela que também sempre desconfiou de sua filha, mas a habituação a essa ideia foi um processo, “minha reação na época foi uma reação de ‘não é exatamente o que eu tinha imaginado, mas você é minha filha, você será minha filha para sempre’. Quando você tem filho, você pensa ‘ah, vou ter uma menina.’ Você imagina que a menina goste de meninos. Eu aprendi a me adaptar a essa situação, porque, em nenhum momento, eu deixei de amá-la da maneira que eu a amo até hoje, porque ela é uma pessoa incrível. Eu falei para ela ‘eu vou me acostumar com essa ideia.’ E foi o que eu fiz. Isso era um problema que eu é que tinha que entender comigo mesma.”

Katia pensa que o momento atual indica um retrocesso com relação às conquistas atingidas pelas minorias e se preocupa pela filha. “Com relação aos nossos governantes, eu acho que a gente está em uma era medieval, tanto municipalmente, como estado, como união. Eu acho que é uma verdadeira avalanche sobre o povo brasileiro, que demorou tanto tempo para construir algumas conquistas, que agora estão sendo destruídas em meses. E eu acho que o que é pior de tudo é um alimento ao preconceito. A única coisa que me preocupa muito é o fato da minha filha estar exposta com uma namorada e ser agredida ou sofrer alguma coisa, nunca na minha vida eu imagino a minha filha machucada por uma razão dessa. O meu grande medo é esse.”, desabafou.
Jane Torgano, mãe de Pedro Torgano, que se assumiu por volta dos 18 anos, também sempre desconfiou da orientação sexual do filho, considerando até mesmo demorado o tempo que Pedro levou para falar do assunto. Segundo ela, a demora teve, como principal motivo, exatamente as expectativas sociais. “Eu fiquei um pouco triste porque meu filho demorou muito para me falar e acho que isso o fez sofrer desnecessariamente. Mas ele me disse que o principal motivo foi pela dificuldade em ‘quebrar as expectativas’ que temos em relação aos filhos, mas a nossa expectativa é que sejam pessoas boas, estudiosas e que façam sempre as melhores escolhas.”, contou.
Contudo, Jane também demonstra medo com relação ao quadro sociopolítico atual, “um horror o momento político que vivemos. Não há o que comentar dessa gente sem valor que hoje nos representa. Claro que me preocupo muito mais agora, pois os homofóbicos se sentem representados e muito mais à vontade para agir. A população LGBT+ e seus familiares devem ser mais cautelosos e se expor o mínimo possível. Uma pena que estamos passando por isso. Muito me preocupa meu filho nas ruas nesses momentos de tantos preconceitos explícitos, fortalecidos por nossos governantes nas três esferas do governo, no caso aqui do Rio de Janeiro.”

Apesar das preocupações, a família aparece, nesses momentos, como uma base de apoio extremamente importante. “Um filho hétero não sente necessidade de conversar sobre isso com os pais, então porque os homossexuais devem sentir esta necessidade? Isso faz parte do preconceito que está embutido na nossa sociedade e é exatamente isso que precisa acabar. Quando eu converso naturalmente com os amigos e familiares sobre a orientação sexual dos meus filhos, é justamente para que os preconceituosos tenham oportunidade de mudar, vendo o quanto é natural a diversidade na nossa família”, disse Jane Torgano.
Katia Mitke discorre também sobre o que, para ela, é o conceito de família e a importância dessa estrutura, “uma das coisas que eu aprendi com a Luíza é que uma família é feita de pessoas que se amam e aí independe se é menino com menina, homem com homem, mulher com mulher. Isso não interessa. Toda forma de amar vale a pena. Acho que as pessoas tem que amar. Não interessa quem você ama. Interessa que você ama. Ponto e acabou. Pra mim família é isso, são duas pessoas que se amam e que querem construir alguma coisa juntas.”. E comenta, ainda, que espera que sua filha encontre isso para si, “acho que ela quer formar uma família sim. Acho mesmo. Não acho que ela quer ter filho não, mas querer formar uma família, querer ter alguém do lado dela, isso eu acho que ela quer muito. Ela é uma pessoa que imagina ser feliz ao lado de uma pessoa que ela ame.”, revela.
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