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Catar vence FIFA por WO, no jogo geopolítico

  • bixcoitodiario
  • 29 de mai. de 2019
  • 4 min de leitura

Com a desistência da FIFA em aumentar para 48 as seleções do Mundial de 2022, Copa do Catar continua com 32 equipes


Por: Alcina Quintela


A Federação Internacional de Futebol (FIFA) voltou atrás em sua tentativa de antecipar, já para a Copa do Mundo de 2022, a ampliação do número de participantes de 32 para 48. O Catar, pequeno pais do Oriente Médio, rico em gás natural e anfitrião do próximo mundial, sempre foi contra a mudança.


Aprovada pela FIFA em janeiro de 2017, a ampliação do formato da competição era uma das promessas de campanha do atual presidente da entidade, Gianni Infantino, eleito em 2016. Como implicava na reestruturação do torneio, que passaria a ter 80 jogos ao invés dos atuais 64, a mudança havia sido prevista para acontecer apenas a partir da Copa do Mundo de 2026. Entretanto, em 2018, Infantino sugere antecipar a decisão e a FIFA elabora um "estudo de viabilidade" quanto à realização da Copa do Catar, de 2022, já com 48 seleções.



Mas por que tanto interesse em aumentar o número de países participantes das Copas?


Com 81 páginas e aprovado em março de 2019, durante reunião do Conselho da FIFA, o documento Copa do Mundo da FIFA, Catar 2022 - Estudo de Viabilidade quanto à Ampliação do Formato para 48 Equipes concluiu que o aumento do número de equipes só seria possível se o Catar dividisse a sede da Copa com algum país vizinho.


Segundo a previsão do estudo, a realização do Mundial em sua versão "ampliada" aumentaria também a receita total do evento em mais 400 milhões de dólares (cerca de 1,6 bilhão de reais). Isso porque com um maior número de jogos (de 64 para 80) haveria também mais espaços publicitários à venda e as disputas do Mundial, mesmo aquelas entre seleções com menor destaque, geram sempre grande audiência no mundo todo. Afinal a Copa do Mundo de Futebol Masculino sempre foi a principal fonte de financiamento da FIFA.



O presidente da FIFA, Gianni Infantino, queria a Copa do Catar/2022 já com 48 países. Foto: AFP

Para Irlan Simões, membro do Grupo de Pesquisa Esporte e Cultura, da Faculdade de Comunicação Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCS/UERJ), historicamente as ampliações de participantes na Copa do Mundo se dão por interesses de reprodução dos grupos de poder dentro da FIFA e das demais confederações continentais. “Elas serviam como moeda de troca a ser convertida em voto a cada nova eleição. Não há muita dúvida de que o aumento para 48 seleções é parte de uma das dinâmicas de reprodução do poder dentro das entidades organizadoras do futebol global”, diz o pesquisador.


Já Abdalla Abud, biólogo carioca apaixonado por futebol, confessa que, apesar de sua ascendência árabe, ainda não está muito interessado na Copa do Catar. “Vi alguma coisa sobre isso na TV, mas agora estou mais interessado mesmo é na Copa América, aqui no Brasil. Ouvi dizer que o Catar e o Japão também vão participar, mas por quê? Eles por acaso são países ‘americanos’?”, questiona Abdalla.


O caso da Copa América é mais específico, segundo Simões, pois apesar de ser um importante torneio continental, histórico e agora centenário, conta com poucos participantes. A Eurocopa, por exemplo, precisa fazer uma eliminatória antecipada para definir seus 24 participantes e ainda assim esse “filtro” europeu consegue selecionar o dobro de equipes que a Copa América mobiliza. “Convites a seleções como Japão e Catar acontecem há décadas na Copa América. Talvez fosse mais sensato estabelecer critérios mais concretos para os convites aos países do próprio continente americano. A tentativa de dar maior poder comercial ao torneio - que é o que se busca com esses convites - na verdade acaba desvalorizando um torneio que poderia ser muito mais interessante se focasse no seu potencial continental”, afirma Irlan Simões.



FIFA perdeu por WO


O estudo de viabilidade elaborado pela FIFA indicava Bahrein, Kuwait, Arábia Saudita, Omã e Emirados Árabes Unidos (EAU) como possíveis candidatos para dividir com o Catar a realização da Copa de 2022, numa versão ampliada para 48 equipes. Mas destacava que "qualquer decisão de incluir potenciais países anfitriões exige o acordo do Catar".


Envolvido em divergências políticas com seus vizinhos e passando por uma situação delicada dentro da própria FIFA, desde que surgiram denúncias quanto à existência de irregularidade na votação de 2010 que o definiu como a sede do Mundial de 2022, o Catar nunca havia demonstrado grande interesse nesta mudança. “Não agradou ao Catar ter ‘a sua’ Copa como experimento de 48 seleções. A monarquia teocrática tem interesses dentro do que muitos estudiosos tratam por soft power: demonstrações de poder e influência através de estratégias de comunicação que se valem de veículos como o futebol, por exemplo”, destaca Simões.


Mas o estudo da FIFA já apontava para a situação geopolítica do país, isolado pelo boicote diplomático e econômico que lhe foi imposto desde junho de 2017 pelos mesmos Bahrein, Arábia Saudita e EAU. "O envolvimento desses países na organização do torneio em conjunto com o Catar implica no levantamento deste boicote", dizia a FIFA. Várias fontes concordavam que, dos países indicados pelo estudo de viabilidade da FIFA, Omã e Kuwait seriam os mais indicados para dividir com o Catar a realização da Copa de 2022, em virtude de sua neutralidade na crise. Mas apenas o Kuwait possuía estádios com o chamado "padrão FIFA": capacidade para pelo menos 40.000 pessoas.


Em abril de 2019, Gianni Infantino, de olho nas próximas eleições da FIFA, se empenhou pessoalmente para quebrar o impasse e chegou a viajar ao Kwait com sua família em um jato particular, segundo alguns jornais franceses. Mas em 22 de maio de 2019, a federação voltou atrás, jogou a toalha e em nota oficial afirmou: "A FIFA se empenhou em explorar todas as possibilidades para ampliar o número de equipes para a Copa de 2022, de 32 para 48, envolvendo países vizinhos ao Catar, e concluiu que isso não será possível, diante das atuais circunstâncias".


Mas esta derrota da FIFA por WO - expressão usada no esporte quando a vitória é dada para um dos competidores quando o outro desiste do desafio - parece não preocupar nem Infantino, que é candidato único à presidência da entidade nas próximas eleições, nem a maior organização esportiva do mundo. No final das contas isso foi só uma prorrogação: o novo formato ampliado e, principalmente, mais lucrativo do Mundial já está confirmado para acontecer a partir da Copa de 2026, que será realizada em conjunto por Estados Unidos, Canadá e México. Quem viver verá.

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